Governo tem de expulsar garimpo de terras indígenas

O Globo, Opinião do Globo, p. 2 - 25/01/2023
Governo tem de expulsar garimpo de terras indígenas
Situação trágica dos ianomâmis revela necessidade de plano robusto para resgate da lei na Amazônia

Por Editorial
25/01/2023 00h10 Atualizado há um dia

A visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Roraima na semana passada, para ver de perto a situação dos índios ianomâmis, trouxe para o noticiário o quadro trágico de subnutrição, malária e doenças respiratórias responsáveis pela morte dos indígenas, em especial crianças. As imagens chocaram o país e o mundo.

A situação resulta do descaso do governo Jair Bolsonaro com os povos originários. Diante da leniência das autoridades, vastas áreas de reservas indígenas foram entregues à exploração de madeireiros e garimpeiros, em desafio ao que determinam a lei e a Constituição. Ainda no ano passado, o Ministério Público Federal fez um alerta à equipe de transição. Constatou que as áreas de garimpo em terras indígenas cresceram 862% desde o primeiro governo de Dilma Rousseff. Não apenas os 28 mil ianomâmis estão ameaçados. As reservas com maior área ocupada pelo garimpo ilegal são dos caiapós e mundurucus, ambas no Pará.

O novo governo, que assumiu com a missão de desfazer o legado de Bolsonaro na Amazônia, tem a obrigação de reverter esse quadro. Ainda na sexta-feira, o Ministério da Saúde decretou estado de emergência em saúde pública. A ministra Nísia Trindade anunciou melhorias na Casa de Apoio à Saúde Indígena, em Roraima, e reforços ao SUS da região. São corretas as primeiras medidas, mas é imprescindível trazer logo mais médicos e profissionais ao Distrito Especial Indígena Ianomâmi. Sem estrutura, será impossível prestar assistência básica para evitar que doenças triviais como pneumonia ou diarreia se tornem fatais.

A atenção de emergência e os primeiros socorros devem ser apenas o começo de um plano interministerial mais robusto para expulsar os criminosos das reservas indígenas, afastá-los do contato direto com os índios, fechar garimpos que envenenam os rios da região e explorações de madeira que desmatam a floresta. Não será uma situação fácil de resolver. As estimativas falam em 20 mil garimpeiros apenas nas terras ianomâmis. Na busca por ouro, eles assoreiam e poluem os rios com mercúrio, outra causa de doenças na população. Um estudo da Polícia Federal avaliou que o nível de mercúrio nas águas da região está em quase 90 vezes o tolerável para o ser humano.

Ao envenenamento dos peixes se soma o desmatamento de áreas férteis, antes cultivadas pelos indígenas. Isso reduz a disponibilidade de alimentos e leva à desnutrição. Outro problema é a falta de mão de obra em aldeias para caçar, pescar e cultivar a roça, pois jovens indígenas têm sido aliciados por garimpeiros com drogas, bebidas e armas, conta o pesquisador Estêvão Benfica Senra, do Instituto Socioambiental. Não faz muito tempo que os ianomâmis estão em contato com outras populações, portanto ainda não têm memória imunológica coletiva capaz de protegê-los de doenças contagiosas.

A reserva ianomâmi tem cerca de 10 milhões de hectares, entre Amazonas e Roraima, onde fica a maior parcela das terras indígenas. São ao todo 371 comunidades de difícil acesso, distribuídas em meio à floresta densa, onde ainda há indígenas isolados, sem nenhum contato com o mundo exterior. É uma área que o país precisa saber preservar, tanto por razões humanitárias quanto ambientais. A visita de Lula a Roraima foi importante por reforçar a importância que o governo dá à crise indígena e à destruição da Amazônia. Agora vem a parte mais difícil.

O Globo, 25/01/2023, Opinião do Globo, p. 2

https://oglobo.globo.com/opiniao/editorial/coluna/2023/01/governo-tem-de-expulsar-garimpo-de-terras-indigenas.ghtml
PIB:Roraima/Mata

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