Sem barreira sanitária, aldeia que fica a 15 km de roçado de índios isolados registra primeiro caso de Covid-19

O Globo - https://oglobo.globo.com/brasil - 29/07/2020
Sem barreira sanitária, aldeia que fica a 15 km de roçado de índios isolados registra primeiro caso de Covid-19
Passados quatro meses desde que os primeiros indígenas foram infectados na Amazônia, governo não apresentou um plano objetivo que privilegiasse a região de povos não contatados

Daniel Biasetto

RIO - Apontado como uma das áreas mais vulneráveis à contaminação de índios isolados pela Covid-19 , o alto curso do rio Itaquai registrou o primeiro caso do novo coronavírus de um indígena kanamari, morador da aldeia Hobana, distante a apenas 15 quilômetros de roçados de um grupo que ainda não foi contatado.
Há ainda a suspeita de um outro kanamari infectado na aldeia Terra Nova, todas dentro do Vale do Javari. À margem direita do rio Itaquaí é que se localiza a maior concentração de povos isolados do mundo. O GLOBO teve acesso a uma troca de mensagens entre o coordenador do Distrito de Saúde Especial Indígena (Dsei Vale do Javari) e servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai) que confirmam o registro
Por não terem memória imunológica para resistir às mais simples gripes, esses povos originários correm risco de serem dizimados caso o coronavírus se espalhe por suas aldeias.
A junção dos rios Itaquaí e Juruá foi apontada por especialistas durante reunião da Sala de Situação, criada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), como uma das mais preocupantes para o contágio desses povos (isolados) uma vez que tem maior movimentação nos caminhos ("varador") que ligam as aldeias Kanamari a esses dois rios. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) apresentou pedido ao governo para que se concentrasse nesses pontos e reformulasse a proposta de criação de barreiras sanitárias, conforme revelou O GLOBO nesta quarta-feira.
"A estratégia prioritária nessa localidade deve ser proteger a contaminação que pode vir a partir do alto curso do rio Itaquaí, no varador (caminho na floresta) desse rio com a TI Mawetek (Kanamari), no rio Juruá. Segundo informações que emanam da região esse trânsito dos Kanamari nesse varador continua ativo e certamente é uma das principais portas para infiltração da covid-19 nessa região da TI Vale do Javari", diz o documento enviado ao coronel Cláudio Saturnino, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
Das preocupações apresentadas pela Apib e especialistas, a criação de uma barreira sanitária justemante na aldeia Hobana era a primeira da lista enviada ao governo, que até hoje, passados quatro meses desde os primeiros casos de coronavírus entre índios da Amazônia, não apresentou um plano objetivo que privilegiasse a região de povos isolados.
"À luz do que precede, propomos uma Barreira Sanitária nas proximidades da aldeia Hobana (Kanamari), no alto curso do Itaquaí, a qual possa dialogar com os Kanamari dos riscos que existem sobre essa movimentação, monitorar o fluxo nesse varador e construir espaços de quarentena para que possam ser usados pelos indígenas em trânsito.
O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, tinha dado 10 dias para o governo apresentar um plano de criação de barreiras, mas a AGU pediu para renovar o prazo, que termina nesta quarta-feira.
Governo foi avisado
Diante da tragédia que se anuncia, a Apib enviou um comunicado de "situação de emergência" no alto curso do rio Itaquaí, no Vale do Javari ao coronel Saturnino. O documento lembra ao GSI que o governo havia sido avisado no último dia 23 de julho sobre a necessidade de se apresentar um plano urgente para as macro-regiões do Vale do Javari e do estado do Acre em razão da exposição dos povos isolados à Covid-19.
Os especialistas não só criticaram, mas também apresentaram o que deveria ser um procedimento básico para atuar nas imediações da aldeia onde o kanamari foi infectado.
"Varador entre o alto rio Itaquaí e rio Juruá - Ponto de Apoio na aldeia Hobana, ou nas proximidades (com radiofonia), para monitoramento e diálogo com os Kanamari para evitarem de utilizar esse caminho. Instaurar protocolos sanitários para quem entra e sai no varador e ter acampamento próximo que possibilite realizar quarentena. Utilizar profissionais da saúde e servidores e indígenas contratados pela Funai."

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