Desnutrição nas Aldeias

O Progresso- http://www.progresso.com.br - 21/01/2017
Sem alimentos e água potável, algumas comunidades indígenas da Grande Dourados voltam a enfrentar "velhos" e "conhecidos" fantasmas da desnutrição. Passam-se os anos e a história se repete. O que chama a atenção é que o enredo não é novo e os personagens principais também não. E o drama é real e parece nunca ter fim. Algumas cenas dessa "novela" foram novamente retratadas pelo Jornal O PROGRESSO, na edição de quarta-feira, 18, de janeiro. Na reportagem, lideranças de acampamentos Guarani e Kaiowá de Kurusu Ambá (Coronel Sapucaia) e Pyelito Kuê (Iguatemi), contam que centenas de crianças já apresentam quadro de desnutrição. Segundo os relatos, as cestas básicas, que são distribuídas pela Companhia Nacional de Abastecimento estariam atrasadas desde novembro e água, só de açude. Nesse território indígena a fome das crianças só passa, quando o sono chega. E para matar a sede, restam os açudes, onde se misturam gado e gente.

Conforme apurou a reportagem, mais de 200 crianças estariam desnutridas, sendo que 20 delas já estão acamadas. Por outro lado, a Companhia Nacional de Abastecimento explica que no início de dezembro foram entregues 200 cestas. Não se tratam simplesmente de dados comparativos, ou de confrontos de informações, mas de uma realidade que precisa ganhar contornos diferentes e perspectivas mais resolutivas para o problema. O que não pode ser ignorado são os estudos sobre o assunto, que contribuem para um entendimento mais empírico e menos teórico.

Segundo relatório da Rede Internacional de Informação e Ação pelo Direito Humano à Alimentação, nessas comunidades, 42% das crianças, menores de cinco anos, sofrem de desnutrição crônica, apresentando baixa estatura e peso para a idade.

Com base nesse percentual, o professor da Faculdade Intercultural Indígena da Universidade Federal da Grande Dourados, Neimar Machado de Souza, explica que as causas dessa crise decorrem do fato que estas e outras comunidades indígenas enfrentam histórico abandono e racismo institucional. Ele lembra os acontecimentos de 2005, quando o problema da desnutrição nas aldeias indígenas ficou mais evidente, com registros de mortes. Segundo o professor, na época, algumas medidas paliativas foram tomadas, contribuindo para a redução, mas não a reversão nos casos de desnutrição. Mesmo assim, para ele, ainda faltam políticas públicas.

Essas observações mais especializadas evidenciam ainda mais a ausência do poder público. Em 2010, um levantamento da Fundação Nacional de Saúde indicava que a taxa de mortalidade infantil nas aldeias indígenas de Dourados ainda preocupava as autoridades de saúde em Mato Grosso do Sul e no país. Os dados, divulgados pela Secretaria Especial de Saúde Indígena, apontavam que naquele ano houve 32,11 mortes de crianças de até um ano de idade para cada mil nascimentos nas aldeias do município. O índice estava 13 pontos acima da taxa brasileira, que era de 19 para cada mil nascimentos, segundo estatísticas do Ministério da Saúde.

Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a população indígena brasileira é de 817.963 indivíduos, destes 502.783 vivem na zona rural e 315.180 na zona urbana brasileira, representam 305 etnias e falam 274 línguas. Esses povos estão espalhados por quase todos os estados brasileiros. Na região Centro-oeste, o Mato Grosso do Sul soma 77.025 indígenas pertencentes a 12 etnias diferentes. Em Dourados as aldeias que possuem maior população indígena são a Bororó, com 5.905 mil e a Jaguapirú com 5.823 mil.

Em 2014, uma dissertação de mestrado da Universidade Federal da Grande Dourados, defendida por Caroline André de Souza Jorge, colocou novamente em debate a desnutrição indígena. Segundo o estudo, dentre as 435 famílias identificadas, a maioria delas apresentou algum grau de insegurança alimentar (64,1%). Na pesquisa ficou evidente que a elevada prevalência de insegurança alimentar encontrada demonstra uma situação preocupante que as famílias vivenciam.

É perceptível, pela situação relatada atualmente, que pouca coisa mudou. Ou quase nada. A ausência de projetos mais contundentes paras as comunidades indígenas sul-mato-grossenses, não se restringem à desnutrição, mas afetam também o setor educacional. Em algumas aldeias, as crianças para terem acesso à escola precisam andar todos os dias mais de 20 quilômetros. Algumas lideranças reivindicam ações mais efetivas da Fundação Nacional do Índio. Durante a realização da Reportagem, a redação entrou em contato com a Secretaria Especial de Saúde Indígena que disse que iria mandar uma nota essa semana sobre o caso. Após a publicação da matéria e antes da conclusão deste editorial, o órgão não se pronunciou.



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PIB:Mato Grosso do Sul

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