Dinheiro das comunidades sustenta comércio de Marabá

Estado de S. Paulo-São Paulo-SP - 07/11/2005
Calote na praça cresceu e parte da conta acabou nas mãos da Vale; para cacique, ´tem muito branco enganando índio´


O dinheiro repassado pela Companhia Vale do Rio Doce às associações
indígenas é um importante motor do comércio de Marabá, sul do Pará.
Nas confecções e nos supermercados, os índios são clientes fiéis.
Tidos na comunidade como 'ricos', pois desfilam em carrões, eles são
muitas vezes explorados por comerciantes, que empurram produtos
desnecessários, inflam preços ou vendem fiado, além de superfaturar
notas que muitos não sabem ler.
No ano passado, a pendura dos índios envolveu duas dezenas de
estabelecimentos. A situação ficou tão crítica que foram realizadas
reuniões de comerciantes na Associação Comercial e Industrial de
Marabá (Acim), com a participação do Ministério Público
Federal. 'Alertamos os comerciantes para terem cuidado e, aos
poucos, os índios foram pagando', diz o presidente da Acim, Félix
Miranda.

'Tem muito branco enganando os índios', reclama o cacique Bep Karoti
Xikrin, um dos líderes da Associação Bep Nói, que chegou a dever R$
1,1 milhão. Parte desses créditos foi coberta pela Vale, depois de
algumas manifestações e ameaças. Hoje, a associação deve R$ 600 mil,
principalmente para empresas de táxi aéreo, mas conseguiu renegociar
e está pagando em parcelas mensais de R$ 43 mil. 'Fizemos escola na
aldeia. Nossos filhos vão aprender a ler e a falar português.'

Com o aumento da freqüência das idas dos índios à cidade, a questão
indígena se tornou um assunto tal qual o futebol em Marabá. Do
taxista ao comerciante, todo mundo tem uma opinião.

'Alguns índios são malandros, mas grande parte é ingênua. Os Xikrin
têm uma cultura preservada, mas são muito primitivos e tem muita
gente na cidade querendo passar a perna neles', diz o dono de uma
loja de roupas que prefere não se identificar.

Depois de deixar acumular um crédito de R$ 30 mil com uma associação
dos índios Gaviões, o comerciante passou a ser mais seletivo. 'Não
vendo mais para os Kyikatejê (associação de uma aldeia dos Gaviões).
Agora só para os Kakarekré (associação dos Xikrin Djudjekô, tida
como a mais bem estruturada).'

Na avaliação da antropóloga Isabelle Giannini, os recursos da Vale
para os índios são necessários e importantes e não estão
descaracterizando a cultura indígena. Mas ela reconhece que o
dinheiro sem planejamento e um programa social por trás está
provocando danos à saúde dos índios e não está surtindo efeito no
campo de educação.

Com a má alimentação e o sedentarismo, surgiram diabetes e
colesterol alto, praticamente inexistentes nessas aldeias cinco anos
atrás. O consumo de refrigerantes, biscoitos e outros produtos
industrializados levou também o lixo para as comunidades, trazendo
ratos e mais doenças.

Já a Vale acredita que está cumprindo seu papel com o repasse dos
recursos às comunidades. M.B.
PIB:Sudeste do Pará

Áreas Protegidas Relacionadas

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