Oficina em Boca do Acre discute os impactos da BR-317

Ipam - www.ipam.org.br - 27/08/2010
Impacto, mitigação e licenciamento foram algumas das palavras-chave usadas na dinâmica de grupo que abriu a programação da "Oficina de sensibilização: o processo de asfaltamento da BR-317", realizada em Boca do Acre, sul do Amazonas. O encontro reuniu, entre os dias 9 e 13 de agosto, representantes das etnias apurinã, jamamadi, kaxarari e jaminawa, além dos grupos dos extrativistas e trabalhadores rurais, povos que vivem nas terras que margeiam o encontro dos rios Acre e Purus.

O objetivo central da oficina, produzida pelas ONGs Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé e Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), com a participação do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), foi criar um espaço para a troca de informações e reflexões sobre a chegada do asfalto e suas consequências na região.

A rodovia federal que liga o sul do Amazonas à Assis Brasil, município acriano localizado na fronteira Brasil-Peru-Bolívia, também é chamada de Estrada do Pacífico, pois se conecta ao corredor rodoviário peruano que vai até o referido oceano. "A BR-317 faz parte de um programa das políticas de desenvolvimento nacional e de integração da América do Sul, sendo financiada pelo PAC (Programa de Aceleração de Crescimento) e pelo o IIRSA (Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana)", explica a pesquisadora do IPAM Elsa Mendoza em sua apresentação.

Na sua parte acriana, a BR-317 está completamente asfaltada. As obras de pavimentação estão atualmente no trecho que une Boca do Acre (AM) à divisa dos estados do Amazonas e Acre. A estrada influencia, direta e indiretamente, mais de 10 áreas indígenas e de conservação ambiental, além de cortar o território de duas TIs (Apurinã do km-124 BR-317 e Boca do Acre), gerando muito debate.

O índio apurinã Francisco Gonçalves, vice-presidente da Organização dos Povos Indígenas Apurinã e Jamamadi de Boca do Acre (OPIAJBAM), ressaltou durante o encontro que seu povo já sente as conseqüências da estrada desde que ela foi aberta na década de 50: "O principal impacto foi sobre a nossa cultura, pela convivência com pessoas de outros lugares. Nas duas terras cortadas pela rodovia, os índios já não falam mais a nossa língua".

Hoje, a paisagem das margens da BR-317 é repleta de fazendas de gado. Florestas somente são avistadas quando se atravessa as Terras Indígenas demarcadas. A população local alerta sobre a presença de conflitos entre posseiros e pecuaristas, além de invasões de todas as partes para retirada de madeira. O asfaltamento da estrada tem preocupado os povos indígenas e tradicionais de Boca do Acre, que temem o agravamento dos problemas que já existem.

"O asfalto vai trazer mais ameaças para nós. Invasão de madeireiro, de pesqueiros, tráfico de drogas, prostituição, bebida alcoólica. Minha aldeia Camicuã, uma das mais próximas da cidade, será diretamente impactada. Não estamos preparados para combater tudo isso", alertam os representantes dos povos indígenas destas áreas. Um dos propósitos da oficina foi fornecer às comunidades impactadas informações sobre o processo de licenciamento ambiental da BR-317. O principal documento colocado para análise na reunião foi o Parecer do Ministério Público Federal (MPF) do Amazonas, de junho de 2010.

O MPF identificou a consulta inadequada às populações indígenas, e ausente às comunidades extrativistas e de trabalhadores rurais, refletindo na elaboração de estudos e programas insuficientes para a mitigação e compensação dos impactos provocados pelo asfalto. O MPF recomendou que a obra seja paralisada até a realização da revisão e complementação do Estudo de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) e do Estudo Etnoecólogico (EEE).

Atualmente, há um recurso destinado para o Programa de Apoio às Comunidades Indígenas elaborado pelo DNIT (Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes). O "desafio agora é elaborar um programa com o que nós, indígenas, necessitamos de verdade", explica José Alberto Gonçalves, mais conhecido como Juca Apurinã, representante da Associação dos Pupykari da Terra Indígena Kamicuã (APTIKAM).

Durante os cinco dias do evento, foram discutidas questões relacionadas ao movimento indígena, aos impactos das grandes obras de infra-estrutura, às etapas e documentos do processo de licenciamento, à legislação ambiental e indigenista, entre outras. Indígenas e ribeirinhos também fizeram uma linha do tempo onde expuseram o histórico do asfaltamento da BR-317 no estado do Amazonas.

"Agora estamos conhecendo histórias de outros povos indígenas que também foram, e estão sendo, impactados por obras de estradas", expõe Francisco Apurinã durante o debate. "Eu não tinha conhecimento de como funcionava o processo de licenciamento. O que era impacto, licença prévia, de instalação, etc. Com a oficina, aprendemos sobre a legislação e os direitos que garantem a inclusão das terras indígenas nos estudos do impacto ambiental", afirma Juca Apurinã no último dia da reunião.

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PIB:Juruá/Jutaí/Purus

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