Incêndios atingem povoado indígena

Diário de Pernambuco http://www.diariodepernambuco.com.br/ - 10/12/2018
Quarenta e um dias após o incêndio de uma escola e um posto de saúde municipais, a comunidade Bem Querer de Baixo, localizada no município de Jatobá, no Sertão, povoada por indígenas da etnia Pankararu, sofreu mais um ataque. Dessa vez, o alvo foi a capela de Nossa Senhora da Conceição, localizada dentro da comunidade, ironicamente no dia dedicado à santa. Segundo moradores de Bem Querer de Baixo, a igreja foi queimada e depredada na madrugada de sexta para o sábado. Em um perfil de Facebook, um familiar de um posseiro, que reside atualmente em Aracaju (Sergipe), disse que "ainda faltam as paredes" da capela a serem derrubadas e parabenizou os responsáveis pelo ato criminoso.

"Ninguém da comunidade viu nada, porque devido aos últimos acontecimentos ninguém se sente seguro para sair à noite. Assim que, por volta das 8h do sábado, uma moradora viu que haviam depredado a igreja. Um amontoado de pedra e pau foi encontrado dentro do santuário cuja padroeira é Nossa Senhora da Conceição. A sorte que não havia festa prevista porque nenhuma atividade está sendo feita em Bem Querer de Baixo até o último posseiro sair de nossas terras. E não temos dúvidas de que eles são os autores e responsáveis pelos crimes que vêm acontecendo dentro da comunidade", relatou uma moradora, que preferiu não ser identificada por temer represálias.

Os indígenas informaram que um boletim de ocorrência foi registrado, ainda no sábado, na delegacia de polícia de Jatobá, mas que o caso será somado ao inquérito que investiga o incêndio criminoso na escola e no posto de saúde de Bem Querer de Baixo. "Pedimos, na verdade, um reforço na investigação dos responsáveis. Porque não basta fazer uma ronda policial. Muitas casas foram derrubadas, a igreja de Santo Antônio também. A comunidade está uma verdadeira zona de guerra. E o que é preciso fazer agora é dar nomes, porque todo mundo sabe de onde vêm os ataques. É preciso identificar e punir os posseiros que estão fazendo isso. Hoje estão destruindo prédios, mas amanhã podem ser pessoas", lamentou a moradora. Em nota, a Polícia Civil de Pernambuco informou que a ocorrência foi registrada e já está sendo investigada. O delegado que ficará responsável pelo caso é Daniel Angeli.

Entenda
Em 1940, houve uma demarcação de território no Sertão pernambucano e à etnia indígena Pankararu foram reservados 8,1 hectares de terras localizadas entre os municípios de Petrolândia, Tacaratu e Jatobá. Naquele momento, agricultores invadiram as terras destinadas legalmente aos indígenas. Cerca de 20% do território eram ocupados por posseiros. O processo pela reintegração de posse aos indígenas se arrastou por anos na Justiça. Em fevereiro de 2017 e junho deste ano, todas as instâncias judiciais deram ganho de causa ao povo Pankararu, o que resultou numa ação de reintegração de posse no último mês de setembro, quando 12 famílias foram retiradas à força do território indígena pela Polícia Federal. Desde então, começaram os ataques ao povo Pankararu de Bem Querer de Baixo. Atualmente, cerca de 30 famílias de posseiros ainda estão nas terras indígenas.

"Até o momento, a única informação sobre as investigações é que já haviam suspeitos pelos primeiros incêndios (escola e posto de saúde), o que no fundo não é nenhuma novidade. Sempre foi dito que nada seria deixado para o usufruto dos indígenas nessa comunidade. A tragédia sempre foi anunciada e nenhuma medida efetiva foi tomada até agora", relatou uma moradora indígena.

Campanhas
O povo Pankararu tem realizado diversas campanhas presenciais e virtuais em prol de reconstruir a unidade de saúde a escola incendiadas no último mês de outubro. Uma delas é através do site www.vakinha.com.br, onde os interessados podem doar quantias em dinheiro para ajudar na restauração dos equipamentos.

De acordo com moradores da Comunidade Bem Querer de Baixo, que fica a 10 quilômetros do centro do município de Jatobá, desde o incêndio criminoso, as crianças estão sem escola e as pessoas sem atendimento de saúde.

A outra campanha para arrecadar fundos para a reconstrução dos equipamento é uma parceria com a startup pernambucana de moda sustentável Caboklo. A marca está confeccionando camisetas e parte das vendas serão revertidas para a campanha. As camisas ainda não estão à venda, mas é possível acompanhar as atividades e ações da aldeia através da página da etnia no Facebook, Povo Pankararu.




http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/vida-urbana/2018/12/10/interna_vidaurbana,770606/incendios-atingem-povoado-indigena.shtml
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