MPF/RS contesta sentença judicial que anula a portaria de criação da TI de Mato Preto

Ministério Público Federal no Rio Grande do Sul - MPF/RS - www.prrs.mpf.mp.br - 22/10/2015
O Ministério Público Federal em Erechim (RS) recorreu da decisão da Justiça Federal que decretou a nulidade da Portaria no 2.222, de 21 de setembro de 2012, do Ministério da Justiça. A portaria declara como de ocupação tradicional indígena Guarani a área com superfície aproximada de 4.230 hectares denominada "Terra Indígena de Mato Preto". A portaria foi questionada na ação ordinária 5004427-72.2012.404.7117, ajuizada por agricultores contra a Funai e a União.

Em recurso de apelação, o procurador da República Carlos Eduardo Raddatz Cruz pede a anulação e a cassação da sentença, por violação ao direito de consulta e de participação da comunidade indígena.


A sentença que anulou a portaria considera comprovada a ocupação tradicional Guarani na região de Mato Preto até meados de 1930 e deixa expresso o reconhecimento do vínculo de pertencimento dos indígenas com aquele território. No entanto, no caso concreto, a Justiça considerou não haver, na época da promulgação da Constituição Federal de 1988, prova de ocupação indígena no local, tampouco prova da persistência de disputa pela área entre os índios e não-índios materializada por circunstâncias de fato ou por processos administrativos/judiciais. A decisão aplica ao caso a tese do "fato indígena" no marco temporal da Constituição Federal de 1988, concebida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do caso Raposa Serra do Sol, em 2009.

No recurso, o MPF pede a reabertura da instrução probatória na ação, para dar oportunidade de produção de prova testemunhal e pericial antropológica, especificamente para apurar as causas da ausência de efetiva ocupação territorial na data da promulgação da Constituição pelos Guarani de Mato Preto.

Relatório Figueiredo - Raddatz alega que, ao negar o pedido do MPF e não ouvir o testemunho dos índios, a Justiça ignorou a realidade vivida pelos Guarani de Mato Preto no período que antecedeu ao ano de 1988, quando os órgãos de proteção aos índios, supostamente criados para defender seus direitos, ficaram subordinados às políticas governamentais e a interesses que não a proteção indígena. Isso aconteceu especialmente entre 1946 e 1988, conforme apontou a Comissão Nacional da Verdade.

"O contexto estrutural foi propício para que ocorresse a desenfreada apropriação de terras indígenas e seus recursos, a corrupção de servidores e a violência extrema contra índios", ressalta o texto da apelação. O MPF cita o Relatório Figueiredo, escrito pelo procurador federal Jader Figueiredo Correia nos anos 60, que traz denúncias sobre a gestão do Serviço de Proteção ao Índio (o SPI, o antecessor da Funai).

A "doação criminosa de terras", "adulteração de documentos oficiais", "assassinatos de índios (individuais e coletivos)" e "trabalho escravo" são os crimes cometidos pelo SPI transcritos no relatório, citado por Raddatz. O mesmo relatório informa que os índios que viviam nos postos indígenas de Cacique Doble - para onde os Guarani de Mato Preto foram transferidos, após serem expulsos de suas terras na década de 1930 - eram submetidos a tratos desumanos, como espancamentos e trabalhos forçados.

A apelação cita ainda trecho de manifesto entregue ao MPF em Erechim em setembro passado pelos próprios índios. No documento, eles afirmam que os índios que se encontram em Mato Preto derivam de famílias que saíram das TI de Cacique Doble e Nonai, para reaver as terras onde seus avós viveram. Na mesma carta, os Guarani ressaltam que durante os anos 70 "mesmo sabendo que tinha um território que poderiam reivindicar para a comunidade, [as lideranças indígenas] não podiam sair das terras em busca dos direitos e que se saíssem seriam presos e torturados".

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