Índios resistem, Geddel faz reunião

A Tarde - 02/07/2007
A área ocupada no canal do Eixo Norte da transposição do Rio São Francisco recebeu, ontem, novos reforços. São indígenas de diversas tribos que vivem entre os Estados da Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe, nas regiões do baixo médio São Francisco, e também provenientes da Paraíba e do Ceará.

A presença dos índios é uma estratégia para consolidar a ocupação iniciada, na última terça-feira, feita na Fazenda Tucutu, onde está prevista a construção do canal da tansposição por tropas do 2o Batalhão de Engenharia do Exército.
Para hoje de manhã, são esperados contingentes de pankararus, de Petrolândia (PE), além de potiguares, do Rio Grande do Norte, e kariris-xocó, de Alagoas, que se juntarão aos tumbalalás, da Bahia, e às tribos dos pipipam, kambiuam e os próprios trukas, de Pernambuco.

Os índigenas pretendem ampliar ao máximo sua presença na área ocupada, o que significa também dar continuidade ao processo de arar a terra e plantar mudas de feijão e milho.

ENCONTRO - Uma reunião com os governadores de Pernambuco, Alagoas, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Maranhão está prevista para hoje. Os governadores de Sergipe, Marclo Deda, e da Bahia, Jaques Wagner, ambos do PT, não deverão participar do encontro.

Marcelo Deda é frontalmente contra a transposição. Jaques Wagner alegou, como justificativa para sua ausência, que iria participar dos festejos comemorativos da festa de Independência da Bahia, em Salvador.

A reunio foi convocada pelo ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, e vai ser realizada, pela manhã, no Palácio das Princesas, em Recife. Na conversa que terá com os representantes estaduais, o ministro vai reiterar a disposição do governo federal em realizar a obra da transposição, bem como os esforços que vêm sendo feitos para convencer os movimentos sociais sobre sua impor tância.

PINTURA DE GUERRA - Enquanto aguardam para hoje a chegada da ordem judicial de desocupação da área onde estão acampados há quase uma semana, os índios da Tribo Truká, em Cabrobó, montam estratégia de resistência. A orientação do cacique Aurivan dos Santos Barros, conhecido como Neguinho, é cumprir o mandado de reintegração de posse deferido pelo juiz Giorgius Argentini, da 20ª Vara Federal. Ele garante, porém, que os índios vão continuar a luta pela posse da terra.

Reunidos em assembléia, ontem pela manhã, juntamente com integrantes do MST, o cacique orientou os trukás a resistir e a dar exemplo às demais tribos indígenas que vivem nas regiões riberinhas ao São Francisco. "Temos que mostrar firmeza, fortalecer a nossa presença nessas terras, e começar a nos pintar para a luta, que será contínua, até que tenhamos de volta o direito à ocupação de uma terra que sempre foi nossa", disse Aurivan Neguinho.

Ontem, parte dos 1.500 ocupantes, entre trabalhadores sem-terra, índios, quilombolas e outros movimentos sociais, deixaram a área do acampamento na Fazenda Tucutu. Outros grupos, porém, começaram a chegar ontem à noite, engrossando a ocupação.

Além de índios de várias tribos de Pernambuco e de outros Estados nordestinos, novas levas de sem-terra, ligados ao MST prometem chegar ainda hoje à região.

PRONTIDÃO - No acampamento militar, montado na antiga Fazenda Mãe Rosa, a 6 quilômetros da área da ocupação, soldados do 2o Batalhão de Engenharia e Construção, procedente de Teresina (PI) e do 72o Batalhão de Infantaria motorizada, vindos de Petrolina (PE), reforçaram o aparato, com proteção de barricadas e policiamento armado ostensivo na área onde estão desde o mês passado.

Contudo, os caminhões e tratores da equipe militar de engenharia continuam parados. Os militares estão orientados a só começar os trabalhos no canal do Eixo Norte quando for definida a retirada dos índios e dos sem-terra do canteiro de obras.

Trukás reclamam a posse da terra

Os índios vieram para ficar. Essa pelo menos é a disposição das dezenas de famílias trukás, que, desde ontem, começaram a deixar a Ilha de Assunção, onde vivem, para se integrar à ocupação do canteiro de obras do governo na Fazenda Tucutu, nos arredores de Cabrobó.

Alegando uma luta de mais de 10 anos pela demarcação da terra e definição de um processo que se encontra na Fu nai Fundação nacional de Apoio ao Índio), em Brasília, há dois anos, os trukás querem, não apenas ocupar as terras da Fazenda Tucutu, mas também consolidar essa ocupação com a construição de moradias.

SEM-TERRA- A família de Terezinha Maria da Silva Mororó, de 51 anos, é um exemplo do problema da terra vivido pelos trukás. Ela possui cinco hectares de teras na Ilha de Assunção, onde ficam as 25 aldeias que forma a nação Truká, mas os filhos, seis ao todo, não têm como fixar moradia e realizar o plantgio de arroz, milho, feijão e mandioica, base da cultura da aldeia. "Não temos terras", diz um deles, José Roberto da Silva.

Outra família em situação semelhante é a de Marinalva da Silva Leal, 43 anos. Ela chegou ao acampamentro na madrugada da última terça-feira, com os seis filhos, disposta a lutar por um pedaço de terra. "O que tenho mal dá para viver, mas os meus filhos não têm nada. E essa terra aqui (Fazenda Tucutu) é nossa por dirteito e por isso vamos brigar por ela", disse.

CRIME - Além da posse da terra, os índios Trukás, da Ilha Assunção, em Cabrobó, cobram a punição dos quatro policiais militares que assassinaram a tiros, na noite de 30 de junho de 2005, o então cacique Adenilson Vieira dos Santos, de 38 anos, e seu filho, Jorge Ferreira Vieira, de 17, durante uma comemoração na aldeia. Eles alegam que o inqüérito, sob tutela da Funai e do Ministério Público Federal, está parado há dois anos.

Ministro da Integração diz que não há mais o que discutir a respeito da obra

O ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, deixou claro, que todos os meios de diálogo foram tentados e o projeto de transposição exaustivamente debatido com a sociedade. "O direito da crítica faz parte da democracia, mas o limite é a lei. E vamos fazer a obra", disse.

Ele disse que a ação de despejo vai ser cumprida e que os ocupantes do canteiro de obras do canal do Eixo Norte da transposição devem sair de forma pacífica. "Faço um apelo para que assim aconteça. Mas caso isso não seja seguido, cabe ao Estado fazer cumprir a lei", afirmou. Geddel disse, ainda, que não teme desgastes com a situação, e muito menos existe qualquer possibilidade de recuo na execução do projeto. "Sou um homem público e o homem público tem que estar acostumado aos aplausos e às vaias. Por isso mesmo é que não tenho vergonha de governar", completou.

MÁGOA - Ao tempo em que diz entender os posicionamentos contrários à obra e a disposição do governo federal em levar adiante o projeto, o ministro diz que jamais fugiu do diálogo e critica diretamente o bispo da Diocese de Barra, D. Luiz Flávio Cappio. "Telefonei para ele desde a minha posse convidando-o para o diálogo, e nesses quatro meses ele não retornou o convite", disse.

Ele critica também o que ele chama de "movimento ideológico". Todos que votaram no presidente Lula sabiam que ele tinha a disposição de fazer a transposição do Rio São Francisco", disse. Segundo afirmou, a manifestação e ocupação do canteiro de obras em Cabrobó, foi uma surpresa.

"Estive na aldeia dos índios, conversei com eles. Estive no canteiro de obras com o povo. Por que eles não fizeram a ocupação ali?", questionou.

Por fim, quando indagado se a ocupação resultaria em mudança de postura do governo em relação à obra, foi enfático: "Sei conviver com o contraditório. Respeito a Igreja, os sindicatos, as comunidades e movimentos sociais, mas é preciso entender que eles têm a legitimidade para criticar, sugerir e fazer parcerias, mas quem tem a legitimidade de governar é o presidente Lula, que foi aclamado nas urnas. Vamos continuar tendo o melhor relacionamento com todos. Mas vamos fazer a obra", finalizou.



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