União das Nações Indígenas (parte 1)

A Gazeta -Rio Branco-AC - 30/01/2002
A União das Nações Indígenas do Acre e do Sul do Amazonas - UNI, diante dos últimos acontecimentos que envolveram os Kaxinawá da Terra Indígena Nukumã (Terra Indígena do Seringal Curralinho) e os integrantes do Grupo Técnico de Identificação e Delimitação daquela terra, após avaliar todo o processo, vem, publicamente, manifestar-se, através das considerações abaixo:

1 - As populações indígenas possuem "...direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar..." (Constituição Federal de 1988, art. 231). Neste sentido convém reafirmar, que "são terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições" (CF - Art. 231, § 1o). Tais terras "são inalienáveis e indisponíveis e os direitos sobre elas, imprescritíveis" (CF - Art. 231, § 4o). Portanto, são considerados "nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras" indígenas, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, "ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção de direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé" (CF - Art. 231, § 6o). Neste sentido, o povo Kaxinawá das comunidades Grota, Nova Esperança e Formiga tem todo direito de reivindicar uma terra indígena nos termos estabelecidos pela Constituição Federal.

2 - A existência de conflitos e atitudes hostis ao povo Kaxinawá da região não são recentes e devem ser denunciados e combatidos. A região foi ocupada pelas frentes extrativistas na virada do século XIX para o século XX, expropriando as populações indígenas de seus territórios ancestrais, disseminando doenças, provocando o rapto de mulheres e crianças; extermínio; desestruturação cultural; escravização e integração no trabalho compulsório da extração de borracha. Existem evidências documentais que considera rio Envira o rio dos Kaxinawá. Estes, forçados pelo ímpeto da avalanche extrativista, foram obrigados a migrar para os altos rios ou para regiões dos rios Muru e Purus. Mesmo assim muitos grupos e famílias permaneceram na região, sendo integradas e obrigadas a migrar de seringal em seringal, como estratégia de sobrevivência. Acometidas por endemias e sem proteção oficial muitas pereceram. Entretanto, alguns grupos e famílias remanescentes continuaram habitando seus territórios ancestrais. Como o número era reduzido e disperso foram convivendo com seringalistas e seringueiros, resistindo de forma passiva ao aniquilamento total. Recentemente, após a chegada de um novo grupo de famílias oriundo do rio Muru, a população regional - moradores do Seringal Curralinho e seringais contíguos -, majoritariamente posseiros, começaram a praticar uma série de hostilidades e violências, temendo que a presença de um número elevado de famílias indígenas na região resultasse na demarcação de uma nova terra indígena. Apoiados por fazendeiros e autoridades do município de Feijó, os regionais foram desenvolvendo atitudes hostis e discriminatórias com relação aos Kaxinawá da região do Curralinho, chegando-se a destruir moradias, a prática de tortura, a propor propostas espúrias de compra das posses indígenas, etc. Dentro deste quadro de relações adversas, foram iniciados os trabalhos de identificação e delimitação, primeira etapa do processo demarcatório da Terra Indígena do Seringal Curralinho.

3 - Com base na Constituição Federal de 1988 (Art. 231) e no Decreto no 1775/96, a Funai - Fundação Nacional do Índio, cumprindo seu dever legal, instituiu através de ato oficial, o Grupo Técnico de Identificação e Delimitação da TI do Seringal Curralinho. Entendia da necessidade de regularizar aquela terra indígena, visando evitar a continuidade do "clima" de conflito instaurado na região, envolvendo a população indígena e não indígena. Aliás convém citar que, em audiência pública realizada no dia 8 de abril, em Feijó, o próprio governo do Estado do Acre, através do Imac, acatou a recomendação apresentada nos estudos socioantropológicos de que os índios do Seringal Curralinho deveriam urgentemente ter uma terra demarcada. Com o início dos trabalhos de identificação e delimitação os conflitos se acirraram, tendo os regionais, com apoio de comerciantes, fazendeiros, autoridades municipais, políticos e dirigentes de entidades sindicais causado novas agressões às populações Kaxinawá e aos membros do Grupo Técnico, com invasão das margens do rio Envira onde situa-se a Aldeia Grota, roubo de equipamentos, pertences pessoais, seqüestros de bens de pes-soas, etc. Tinham por objetivo impedir de todas as maneiras a existência de uma terra indígena na região e tumultuar todo processo de estudos determinado pela autoridade federal. Neste sentido em nome do Movimento Indígena do Acre e do Sul do Amazonas, a UNI pretende:

a) reafirmar que a tarefa de identificação e demarcação de terras indígenas é prerrogativa da União, conforme determina a Constituição Federal no seu Artigo 231 e o Decreto no 1775/96, sendo previsto aos regionais;

b) repudiar as tentativas dos integrantes da AMSCAE - Associação de Moradores do Seringal Curralinho e Alto Envira em impedir os trabalhos de identificação e delimitação da Terra Indígena do Seringal Curralinho;

c) condenar veementemente as atitudes criminosas praticadas e reivindica as providências necessárias.
PIB:Acre

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