Nhemonguetá é um inventário audiovisual da cultura Mbya Guarani

Jornal do Comércio jc.uol.com.br - 28/08/2017
"Vamos seguir o sol. Ele nunca se cansa de vir." O conselho traduz, em partes, um jeito próprio de pensar: o mundo Mbya Guarani. Documentário etnográfico que propõe um inventário audiovisual desta cultura, em uma travessia entre linguagens, Nhemonguetá tem estreia hoje, às 19h, no CineBancários (General Câmara, 424), com entrada franca.
Com direção de Paola Mallmann e Eugenio Barboza, as filmagens ocorreram na Região Metropolitana, nas aldeias Tekoa Pindó Mirim (Itapuã, próxima da Lagoa Negra), Tekoa Nhundy (Estiva, de apenas sete hectares) e Tekoa Jatai ty (Cantagalo, espaço maior, com nascentes de água, terra sagrada). O filme foi contemplado pelo Fundo Municipal de Apoio à Produção Artística e Cultural (Fumproarte) de 2015 e também arrecadou alguma verba via financiamento coletivo, pela plataforma Catarse, para o projeto cultural Nhemonguetá: Os conselhos entoados pelas crianças Mbya Guarani.
Trata-se de uma abordagem poética dos processos de transmissão de conhecimentos para o bem viver. Conforme é demonstrado no filme, as conselheiras são as kunhã karai. "Karai é o termo em guarani utilizado para se referir à pessoa que é reconhecida como pajé, xamã, curandeiro. A kunhã karai é a mulher que tem essa capacidade de liderança espiritual, mas diferentemente do karai, ela exerce uma potência agregadora na vida política da comunidade também. Trata-se de uma figura detentora da memória do grupo", explicam os realizadores. Paola e Barboza chamam a atenção para o fato de que a escolha do karai é feita pela divindade: "Não se decide em seguir esse caminho, se é chamado pelo Nhanderu. É o Nhanderu também que mostra em sonhos, os próprios lugares onde devem fazer uma aldeia, por exemplo. Ele tem comunicação direta com o plano dos deuses".
A diretora Paola concluiu o mestrado em Antropologia na Universidade Federal Fluminense durante a montagem do filme - seu tema da dissertação - destacando as relações de transmissão de conhecimento tradicional. Ela fala sobre as crenças da etnia: "A cosmologia é permeada de relações profundas com a natureza que vinculam a pessoa aqui nesta terra com um lugar de origem e de retorno após a morte. Nhanderu se comunica, envia sinais que estão na própria natureza, como uma árvore com frutos, como os ventos bons ou ruins que trazem chuvas, tudo é lido pelo idioma dos Guarani".
Eugenio Barboza ficou responsável pela parte técnica do documentário. "Na composição do quadro, seu conceito, olhar, estávamos em diálogo o tempo todo, recebendo a orientação da Paola, que fazia a etnografia com a produção de imagens." Ele conta que o objetivo principal era que os próprios índios direcionassem o documentário e que tiveram como referência o cinema indígena, além de inspiração no trabalho dos cineastas Vincent Carelli e Joel Pizzini.
Um dos princípios de Nhemonguetá é promover a valorização desses saberes para a sociedade em geral. "Na diversidade, podemos nos reposicionar diante de um povo que tem sua identidade vinculada à uma íntima relação com a terra. Precisamos dessa reconexão. Trata-se de povoar o imaginário com elementos de uma consciência indígena das origens de quem se é", comenta Paola, acrescentando que é um desafio a dificuldade do não indígena em reconhecer a importância disso. "O canto-dança foi a armadilha que capturou os sentidos."
Segundo os diretores, as práticas de canto-dança, além de manifestações do modo de ser Guarani, são práticas ressignificadas - "apresentadas para os não indígenas em ambientes urbanos, como ferramentas de visibilidade para esta cultura na contemporaneidade. Tem muita gente em Porto Alegre que não sabe que vive perto de aldeias". Assim, o audiovisual é uma forma de historiografia e arma da preservação na memória para a ambiência dessas diferentes visões de mundo.



http://jcrs.uol.com.br/_conteudo/2017/08/cadernos/panorama/580562-nhemongueta-e-um-inventario-audiovisual-da-cultura-mbya-guarani.html
PIB:Sul

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