Polícia faz megaoperação para prender indígenas e agricultores; CIMI compara ação à ditadura

Sul 21- http://www.sul21.com.br/ - 24/11/2016
No amanhecer da quarta-feira (23), indígenas da terra Passo Grande do Rio Forquilha, entre os municípios de Sananduva e Cacique Doble, região noroeste do Estado, foram acordados pela polícia. Uma mega operação envolvendo Polícia Federal e Brigada Militar deslocou 150 homens, cães farejadores e um helicóptero para cumprir mandados de prisão contra oito indígenas e três agricultores.

As casas da terra indígena e um acampamento foram revirados pelos agentes, enquanto os moradores eram levados a um Centro Comunitário local e colocados deitados com o rosto contra o chão. Mulheres, crianças, idosos, sem exceção. Uma mulher de cerca de 40 anos, foi chamada repetidas vezes de "vagabunda", e teve escoriações nos braços e cabeça, segundo informações do Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Para a entidade, a força empregada pela polícia foi "violenta, descabida e desproporcional".

O caso que culminou na prisão de indígenas e pequenos agricultores foi escalando nos últimos 12 dias. No dia 11 de novembro, os kaingang da região ocuparam uma parte da terra de 1.916 hectares, que teve relatório circunstanciado publicado pelo Ministério da Justiça ainda em 2011 e está em fase de demarcação. A área pertence a fazendeiros que não teriam permitido a entrada de agentes da Fundação Nacional do Índio (Funai) para começar o trabalho de demarcação.

A lavoura de trigo atingida por um incêndio no último domingo também fica nesta terra. Segundo a versão oficial apresentada pelo Procurador do Estado, Rodinei Candeia, o incêndio teria sido provocado como represália às prisões dos kaingangues Ireni e Leonir Franco, ocorridas um dia antes. Os indígenas negam as acusações.

No domingo, o prefeito em exercício de Sananduva, Leovir Benedetti, decretou "estado de calamidade pública em decorrência da situação danosa e de violência causada por atos de indígenas". O decreto diz atender a um "clamor público": "Considerando que o clima tenso e hostil provocados pelos atos dos indígenas, beirando as vias do conflito, o que pode resultar em eminente risco à segurança e à vida dos envolvidos, bem como da população sananduvense".

Benedetti ainda chama a questão da demarcação de terras na região de "criação de terras indígenas".

Em nota, a Polícia Federal afirma que os indígenas e pequenos agricultores presos ontem irão responder pelos crimes de "organização criminosa com fins de extorsão e incêndio criminoso".


De volta à ditadura


As prisões e a operação que levou a elas, porém, motivou um relatório-denúncia por parte do CIMI. A entidade questiona a prisão dos indígenas já que não foram apresentadas provas que comprovem a participação deles no incêndio. No relatório, o Conselho afirma que os advogados dos indígenas não tiveram acesso aos autos do processo, por razão de sigilo, mas que a Polícia Federal teria quebrado segredo de justiça ao levar jornalistas da região para acompanhar a operação ao vivo.

O documento denuncia o uso de abuso de autoridade, exposição vexatória e prisão ilegal em massa de todos os indígenas, afirmando que "práticas similares só foram realizadas contra os indígenas durante a ditadura militar". A entidade afirma ainda que o delegado responsável pelo caso, Mário Luiz Vieira, possui "inúmeras denúncias contra ele de (...) criminalização dos povos indígenas, abuso de autoridade e ilegalidades em diligências da CPI da Funai apuradas pelo Conselho Nacional de Direitos Humanos".

"Há uma operação entre Ministério Público Estadual, a Farsul e a Polícia Federal, tudo muito bem articulado para criminalizar os indígenas, como uma pressão para reverter todo o processo demarcatório conquistado até agora", diz o coordenador regional do CIMI, Roberto Liebgott.

Segundo ele, uma das razões que pode ter ajudado na operação foram as declarações da Federação de Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), na última segunda. O presidente da Comissão de Assuntos Fundiários da Farsul e da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), Paulo Ricardo Dias, classificou a situação do conflito em Sananduva como "ato de terrorismo de algumas poucas famílias indígenas".

Seis indígenas e três agricultores seguem presos na Presídio de Lagoa Vermelha. A reportagem tentou contato com a Polícia Federal responsável pela ação, mas não obteve retorno até o fechamento da matéria.



http://www.sul21.com.br/jornal/policia-faz-megaoperacao-para-prender-indigenas-e-agricultores-cimi-compara-acao-a-ditadura/
PIB:Sul

Related Protected Areas:

  • TI Passo Grande do Rio Forquilha
  •  

    As notícias publicadas neste site são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.