Como naquele tempo: não se poderia imaginar que o serviço de inteligência fosse novamente acionado pela Funai para impedir divulgação da realidade

Cimi - www.cimi.org.br - 29/02/2012
Ditadura. Os governos militares e seus milagres econômicos forjados eram extremamente vigilantes para que a sua imagem não fosse maculada através de denúncias de violação de direitos humanos e étnicos dos povos indígenas. O serviço de inteligência (Serviço Nacional de Informação - SNI) estava organizado com equipes dentro da Funai, para evitar vazamento de informações e controlar as lideranças e o movimento indígena e indigenista. Desta forma, conseguiam de alguma forma, impedir constantes denúncias de violências contra os povos indígenas, situações de massacre e genocídio.

Superada a fase da ditadura, não se poderia imaginar que o serviço de inteligência fosse novamente acionado pela Funai para impedir a divulgação da realidade de extrema violência contra os povos indígenas Kaiowá Guarani pela imprensa internacional.

Na semana passada, em articulação com o movimento da Aty Guasu, uma equipe de reportagem canadense esteve em várias áreas Kaiowá Guarani documentando as violências e agressões que sofreram, principalmente a partir do final do ano passado. Quando iam concluir o trabalho junto à Funai de Dourados, foram surpreendidos com uma ordem de prisão e apreensão de toda a documentação realizada durante uma semana. Não foi levada em consideração a veemente argumentação das lideranças indígenas, de que eram eles, e não o governo que decidiam quem eles queriam que os apoiassem. Depois de horas e de alguns contatos com escalões superiores, do Palácio do Planalto e da embaixada, os repórteres canadenses, um dos quais trabalha no New York Times, foram liberados, e deixaram em seguida o país. Parecia uma cena do passado, porém muito atual e em Dourados. Conforme Eliseu Lopes: "É um absurdo o que aconteceu na Funai".

O movimento da Aty Guasu, que hoje inicia mais uma Grande Assembléia em Jaguapiré, reagiu contra o desrespeito às decisões e direitos indígenas. A Aty Guasu estará pautando, discutindo e tomando decisões com relação à falta de políticas claras do governo, com relação a seus direitos, especialmente a não demarcação e garantia das terras indígenas.

Em nota, o Conselho da Aty Guasu se manifesta dizendo que "apesar da existência de nosso direito a recuperar as nossas terras antigas, porém entendemos que até hoje não há ainda uma política clara do Governo Federal para efetivar a demarcação definitiva das nossas terras tradicionais, isto é, em nossa visão não existe uma posição e ação segura do Estado-Nação e da Justiça para efetivar a devolução da parte dos nossos territórios tradicionais reivindicados. Exemplo: a identificação e demarcação de nossos territórios Guarani-Kaiowá iniciadas pela Fundação Nacional dos Índios (FUNAI) ao longo das décadas de 1990 e 2000 se encontram todas paralisadas nas Justiças" (Nota do Conselho da Aty Guasu, 28-02-2012). Após tecer considerações sobre as políticas de Educação e Saúde indígena, afirmam: "Pensamos que seria necessário se construir uma política do Estado para a devolução/demarcação definitiva das partes de nossas terras tradicionalmente ocupadas por nós Guarani-Kaiowá do Mato Grosso do Sul... Cientes de nossas histórias e direitos, como povos indígenas, nós lideranças da Aty Guasu Guarani-Kaiowá vamos lutar reiteradamente pela efetivação dos nossos direitos no Estado do Mato Grosso do Sul e Brasil" (idem).

A Comissão da Aty Guasu que esteve visitando e documentando a realidade vivida em vários acampamentos indígenas na região do cone sul do Mato Grosso do Sul, produziu um relatório que será pauta das discussões da Aty Guasu que inicia hoje em Jaguapiré. "Nós da comissão da Aty Guasu, consideramos que todos os relatos das lideranças das áreas reocupadas serão pautas da Aty Guasu, portanto efetuamos os registros dos fatos constatados durante a nossa visita aos referidos acampamentos indígenas, e por fim submetemos a apreciação de todas as autoridades brasileiras (MPF, SDH, Presidência da República, Funai, Funasa etc.) para tomar providências cabíveis e legais".


Visitas esperançosas

Apesar de toda a situação traumática vivida por várias comunidades Kaiowá Guarani, o clima é de esperança e confiança no seu processo organizativo e apoio dos aliados para avançarem na conquista de seus direitos, especialmente à terra. Visitas de advogados e da desembargadora Kenarik Boujikian Felippe, da Associação de Juízes para a Democracia - AJD, tem contribuído, não apenas para denunciar as violências e situação de genocídio enfrentadas por algumas comunidades, mas especialmente para reforçar a esperança da conquista de dias melhores para o sofrido povo Kaiowá Guarani.

É grande a movimentação das lideranças para Jaguapiré, para esse grande momento político e celebrativo. Não tem tempo ruim. Enfrentam a lama, a chuva e o sol com a mesma confiança e determinação. "Vamos fazer avançar nossos direitos, vamos chegar mais perto da nossa terra, dos nossos tekohá".



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PIB:Mato Grosso do Sul

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